terça-feira, 26 de julho de 2016

Fragmentos de um livro Cigano



Fragmentos de um livro Cigano


Um vento forte e frio adentrou a barraca da cigana Ligia...

Ela estava pondo as cartas sobre a colcha grossa de lã em sua carroça, pressentiu uma dor profunda e seu coração começou a bater mais forte. As cartas deixavam claro...ia acontecer uma morte, e para seu coração só poderia ser seu amado...Gildo.

Levantou se rapidamente, sacudiu a saia farta de babado e cores, passou a mão sobre o coração na esperança de arrancar o sentimento. E um desejo insano de evitar o acontecimento tomou conta de sua alma.  Desceu de sua carroça e sentiu a poeira grossa nas solas dos pés, desatrelou o cavalo e montou seu dorso com fúria e determinação, saiu em disparada para o local onde sabia estar seu amado.

Não ela não ia permitir que ele fosse embora antes dela novamente, já havia acontecido em outras vidas, sabia disso, e agora não ia deixar isso acontecer novamente.

Em um galope insano correu mata adentro pedindo aos céus um milagre, sentiu o olhar de tristeza da lua, o ar da mata cheirava a jasmim seu cheiro favorito. Rogou aos quatro elementos, a agua para lavar toda a sua dor, ao fogo para queimar aqueles pensamentos, ao ar para levar para longe a desgraça que estava para acontecer, e a terra para enterrar aquela sina de muitas outras vidas, que insiste em não deixar ela viver para todo sempre com seu amado.

Perdeu seu amado por muitas e muitas vidas, mas agora seria diferente, ela era uma cigana mais esperta, auspiciosa na leitura das cartas, e soube a hora certa de interromper este maldito destino, ia chegar a tempo e tirar o punhal que estava cravado no peito de seu amado.

Ouvia ao longe o pio da coruja, este mal agouro era apara outra cigana, pensou arfando e com lágrimas banhando sua face. O cavalo obedecia ao seu comando correndo em disparada, cúmplice daquele pacto de amor. Sim, um pacto entre eles, feito na cachoeira quando ainda eram crianças e se reconheceram como amantes eternos. Cortaram as palmas das mãos unindo o sangue de suas veias como um único rio, um único destino.

 Bem a sua frente a clareira que viu nas cartas, no chão seu amado estirado e rodeado de sangue, pulou do cavalo e se atirou sobre ele gritando... Amado, amado...não me deixe novamente...fique comigo.

Num gesto alucinado tirou o punhal que em seu peito estava enterrado...ele suspirou e fechou os olhos como se estivesse esperando ela chegar para morrer de fato. Ela gritou sua dor aos prantos, relutou até que a dor a deixou no chão.

A lua que tudo observava, jogou para ela um manto prateado que envolveu seu corpo dilacerado...e foi assim que ficou profetizado...seu amor agora seria para a lua até que ela encontre de novo em outras vidas o seu amado.

Tina Coelho

Nenhum comentário:

Postar um comentário